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É possível oprimir a própria categoria?
#2
Ok, citando Wikipédia (porque as definições de dicionário que achei são vagas demais):

Citação:Opressão é o efeito negativo experimentado por pessoas que são alvo do exercício cruel do poder numa sociedade ou grupo social.

Desta forma, não é possível que pessoas dentro de um grupo marginalizado oprimam este mesmo grupo, porque não estão exercendo poder ao fazer isso.

Agora, pessoas marginalizadas podem discriminar contra o próprio grupo. Segundo o dicionário do Google, discriminação pode ser descrita como o

Citação:tratamento pior ou injusto dado a alguém por causa de características pessoais; intolerância, preconceito.

Por exemplo, um homem gay que não expressa sua atração por homens por considerá-la doença ou pecado pode demonstrar asco por outro homem gay que está expressando afetividade por outro homem em público. Isso é discriminação, mas não opressão, porque ambos os homens estão sendo oprimidos pela mesma força.

Se o mesmo homem gay disser que mulheres não são tão inteligentes quanto homens e são emotivas demais, ele está discriminando contra mulheres, mas também está contribuindo com a opressão das mesmas, porque, por ser homem, ele não sofre sob o patriarcado, enquanto mulheres sim.

Agora, em relação a discriminar contra pessoas "dentro do mesmo grupo", acho que é possível fazer uma distinção entre características que a pessoa possui e não possui. Porque mesmo falando de grupos como mulheres ou pessoas gays, temos não só as intersecções óbvias, mas também outras características que geralmente não são divididas de forma tão clara, até por não haver necessidade disso na maior parte dos casos.

Por exemplo, dentro da comunidade não-binária, temos pessoas que falam contra neopronomes/neolinguagem (pronomes e outros aspectos de linguagem inventados para serem neutros ou para que pessoas não-binárias possam escolher o que usar), dizendo que "deixam difícil para que outras pessoas levem pessoas não-binárias a sério", que "são difíceis e confusos de usar", que "são desnecessários", etc. Ou seja, temos um grupo que não sente necessidade de neopronomes, que ocasionalmente discrimina contra o grupo que sente necessidade de neopronomes. Acredito que isso não esteja no mesmo nível de discriminar contra alguém por algo que também possuem ou sentem.

Pessoas não-binárias vão ser oprimidas independentemente de usarem neolinguagem ou não, mas é possível que pessoas não-binárias que não utilizam neolinguagem acabem tendo suas vozes ampliadas em certos lugares (por defenderem um status quo exorsexista), além de conseguirem ter sua linguagem respeitada mais frequentemente (falo por experiência, as pessoas acham mais fácil trocar de a/ela/a para o/ele/o do que para -/eld/e ou -/el/-). É um "privilégio" por assim dizer, e essas pessoas não-binárias podem ter efeitos negativos na vida de pessoas não-binárias que precisam de neolinguagem, mas não é um grande privilégio comparável ao de ser uma pessoa cis, por exemplo.

Então, pra resumir:

- Opressão precisa vir de cima para baixo, pessoas da mesma categoria podem se discriminar entre si mas não oprimir;
- Intersecções existem, então uma pessoa oprimida em um aspecto pode oprimir em outro aspecto;
- Mesmo entre pessoas dos mesmos grupos, existem pessoas com características diferentes que podem ganhar pequenos privilégios em relação a outras pessoas dos mesmos grupos, mas que ainda assim não escapam de sofrer opressão.

E, pra terminar:

Eu sei que algumas pessoas consideram que opressão é qualquer discriminação "de cima pra baixo", ou que vem de uma pessoa que não possui aquela característica, e sei que outras pessoas só consideram opressão quando vem do sistema, mesmo incluindo opressões implícitas (não há leis contra todos os grupos marginalizados, mas esses grupos ainda são marginalizados pela cultura que diz que pessoas marginalizadas são ruins/não confiáveis/etc., culminando em prisões injustas, rejeições de aplicações de emprego, xingamentos na rua, etc).

Mas, independentemente disso, é possível que cada pessoa repense suas atitudes para não perpetuar discriminações, ou para não deixar passar porque "todo mundo fala assim". Coloquem avisos de conteúdo quando passarem artigos com linguagem discriminatória, para deixar claro que não apoiam o uso de tal linguagem. Repensem se realmente há necessidade de fazer aquele comentário que chama a atenção para a identidade marginalizada de alguém. Aceitem que a mídia que vocês assistem é discriminatória em certos aspectos, ao invés de inventar desculpas para tentar convencer outras pessoas de que na verdade ela não é.

Nada e ninguém está livre de ser problemátique, a diferença é que podemos ser mais inclusives de pessoas marginalizadas caso tentemos repensar e desconstruir* nossas atitudes.

* oh gosh eu sei que essa palavra é utilizada até a morte de maneiras que eu acho irritantes, mas acho que esse aqui foi um uso relevante.

Btw, eu sei que essa pode ter sido uma tangente estranha, mas estou cansade de ver gente dizendo oH mas isso não foi OPRESSIVO porque {eu sou marginalizade também/só o sistema pode oprimir/não foi de propósito/essa mídia também é progressiva em outros aspectos/etc.} e basicamente invalidando qualquer crítica contra comentários discriminatórios ou utilização de linguagem discriminatória.
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É possível oprimir a própria categoria? - por Aster - 03-10-2017, 10:27 PM

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