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Tradução: Essencialismo de identidade
#1
Essencialismo de identidade é um termo que você pode não ver muito fora de certos círculos, mas, se estiver interessade de alguma forma em discussões sobre identidade e sobre comunidades baseadas em identidade, acho que pode ser útil.

A raiz da palavra essencialismo é essência, sendo a chave para entender do que se trata: o essencialismo faz reivindicações sobre a essência de uma coisa, as qualidades inerentes que a definem, a verdade natural dela em toda a sua extensão. E, quando você aplica esse tipo de perspectiva à identidade, tem-se o que se chama de essencialismo de identidade.

"A grosso modo, essencialismo é a perspectiva de que as categorias têm uma realidade subjacente ou uma natureza verdadeira que não se pode observar diretamente, mas que dá a um objeto a sua identidade. Em outras palavras, segundo o essencialismo, as categorias (como "menino", "menina" ou "inteligência") são reais em vários sentidos: são descobertas (ao invés de inventadas), são naturais (ao invés de artificiais), predizem outras propriedades e apontam para descontinuidades naturais no mundo." – Susan A. Gelman, The Essential Child: Origins of Essentialism in Everyday Thought.

Uma das subcategorias disso que tem sido muito discutida é o essencialismo de gênero. Se alguém afirma, por exemplo, que a natureza da mulher é ser compassiva, está cometendo essencialismo de gênero – neste caso, por meio de uma afirmação sobre as qualidades inerentes e imutáveis da mulheridade.

Esse conceito também se aplica a outros tipos de identidades. Por exemplo, uma abordagem essencialista à orientação pode envolver dizer que "todes têm uma orientação sexual" e que, se não rotular a sua, você ainda não descobriu-a ou você está deliberadamente mantendo-a em segredo… mas você definitivamente tem uma, quer a descreva corretamente, quer não (e há uma resposta "correta" entre as duas). Se alguém afirma que sua orientação é inerentemente definida por um único fator, tal como "por quem você se sente atraíde", isso também é essencialismo de orientação.

Por razões óbvias, o essencialismo de identidade é tipicamente utilizado para apoiar o policiamento de identidades. Para dizer que alguém está "errade" sobre sua orientação ou seu gênero, em primeiro lugar, é preciso acreditar que existe algo como um certo ou um errado sobre o assunto. Você pode acreditar que está escrito em algum lugar do seu DNA, ou em alguma parte inerente da sua alma, ou em uma parte imutável presente em todas as pessoas, por exemplo. Por essa razão, o policiamento de identidades (em geral, e não somente em casos individuais) precisa envolver a defesa de uma abordagem mais flexível dos rótulos.

Em alguns casos, essencialismo de identidade se sobrepõe ao conceito de estereótipo, então você pode se perguntar por que é importante ter o primeiro quando já se tem o segundo. Ambos são bons, definitivamente, mas eu diria que há uma série de circunstâncias em que se pode querer evitar usar um em detrimento do outro, por um par de motivos:

1) "Estereótipo" implica que uma ideia é comum, imposta pela sociedade e/ou amplamente acreditada. Talvez você não queira usar a palavra para ideias que estão mais presentes em nichos, o que torna "essencialismo de identidade" viável. 

2) "Estereótipo" implica "ruim" (e, por extensão, que é bom que ele seja quebrado). Pode ser desconfortável dizer que se vive por um estereótipo, por exemplo, então você pode evitar esse termo quando não estiver tentando enquadrar algo como mau para a comunidade. Chamar isso de "essencialismo de identidade" ainda transmite o ponto sem deixar implícito que é ruim ou que parece ruim para quem exibir o traço em questão.



@sennkestra comentou:

Penso que outro problema é que, muitas vezes, pessoas rotuladas como "essencialistas" também pensam que a ideia de uma essência subjacente 100% pura é bobagem; elas apenas acreditam que talvez haja uma semi-essência misturada com todas as outras coisas, tendo mais dessa perspectiva do que alguém com uma perspectiva menos essencialista.

Isso faz com que eu me lembre de certos debates que surgiram quando estava fazendo um curso de história da sexualidade e que discutiam a ideia de essencialismo versus construcionismo social, com a primeira perspectiva defendendo que supostamente conceitos como homossexualidade estão presentes da mesma forma ao longo de toda a história e com a última perspectiva defendendo que definitivamente identidades como homossexualidade são construções sociais que não existem até que alguém as invente.

Na prática, quase ninguém defendeu uma perspectiva essencialista forte, mesmo ês escritories chamades de essencialistas; o que mais ocorreu foram pessoas argumentando que existem experiências ou traços essenciais que são moldados por nossas construções sociais e pessoas argumentando que podem haver experiências mínimas similares que estão presentes em todos os espaços, mas que, majoritariamente, tudo é uma construção social. Portanto, a questão é mais uma discordância sobre graus do que uma situação sim-não.

— Link da postagem original: https://www.pillowfort.social/posts/984818
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